A vocês

A amizade é a forma de mercantilismo mais genuína que existe. A necessidade da troca é medíocre, mas por isso culparemos a obscura natureza humana, que quase desfalece ao dar sem receber. Sendo assim, não ignoramos o fato de haver o mercantilismo na amizade, apenas tentamos embelezá-lo.

Na amizade abraça-se e se é abraçado, ouve-se e se é ouvido e, impreterivelmente, ama-se e se é amado. Não é do meu conhecimento “amizade platônica”. Para que exista a amizade é necessário que se preencha inúmeros requisitos de reciprocidade. Perceba que recíproco foge à vertente do igual.

Eu posso gostar dos Beatles e você sentir repulsa a antiguidades, eu posso, então, discordar de que Beatles é antiquado e por isso adentrarmos numa discussão sem embasamento, mas enquanto ambos estiverem sempre presentes um para o outro, existe reciprocidade e principalmente: somos de fato amigos.

Na amizade é bom que se ostente a antítese. Um de mim já me é muito. É bom sentar-se à mesa com o oposto. O contraditório desafia e excita, mantendo a chama acesa. Sim, pois não é apenas o amor que vive abrasado. Da amizade traz-se novo fôlego e novo ânimo, que em contrapartida, o amor nos suga.

Esse amor parasita que falo é o amor carente de toque, desejo e sedução. O amor-amigo exige de nós em proporções melhores – nunca menores.

No amor-amor precisa-se do sexo, no amor-amigo precisa-se do abraço. No amor-amor carece-se de atenção, no amor-amigo, compreensão. A amizade se contém e se basta, sem necessitar do sexo, do frenesi. Mas, irrevogavelmente, o amor implora pela amizade.

Amar sem ser amigo é tão ilusório quanto sonhar, tão passageiro quanto a própria vida, ouso dizer.

Há quem valorize muito mais o beijo, mas eu saúdo meus amigos. Não escolhemos a quem amar, mas amamos quem escolhemos para estar ao nosso lado. A amizade é a esperança para o egocentrismo humano.

Depois de tanto sintetizar, confesso que abdico do meu eu por cada amigo que escolhi. Que prometo solenemente amar na alegria e na tristeza, saúde e doença, riqueza e pobreza até que a morte – ou o destino – nos separe. E se for pelo infortúnio do destino, prometo levar a cada filho meu um pedaço de cada um.

A vocês, que são meu sorriso na hora do pranto, a lágrima que não consigo chorar, a razão em meio a loucura e a balbúrdia no meu pesar.

A vocês que conseguem fazer de mim alguém maior, melhor, transcendente e apaixonada pela vida.

A vocês, que amo e zelo como se dentro de nossas veias corresse o mesmo sangue.

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