A grama do vizinho é da cor da sua

Se me permite a indelicadeza, digo a você, a mim, a quem quiser ouvir, que paremos de olhar a vida alheia, desejando-a como alvo inalcançável – “Já que sou, o jeito é ser.”- porque a vida que nos foi dada é, imutavelmente, a vida que nos foi dada. E não é que não podemos fazer nada a respeito, muito pelo contrário, podemos fazer muito disso. Que tenhamos a coragem de perceber que a vida corre sim, apesar do clichê que a envolve, e que sentados não chegaremos a lugar algum. Se a vida de alguém aparenta ser desejavelmente vivível, pare de olhar. Desejos platônicos corroem como câncer, mais traiçoeiros ainda, corroem a alma. Você não sabe quantos objetivos são conquistados nesse meio tempo, nem quanto tempo é perdido quando não gastamos tempo nenhum. Pode soar meio moralista, filosófico e muito, muito utópico, mas se a grama do seu vizinho é mais verde pra você, a sua grama também pode ser mais verde ainda pro seu vizinho. Entendeu? Aí nos remetemos ao ciclo das gramas verdes, sempre cobiçando o que não se pode ter, não por não ser conquistável, mas porque muitas vezes não é pra ser seu. Que deixemos de desejar o que não é pra ser nosso, então. Que paremos de cobrar das pessoas o que elas não podem nos dar. Sim, muitas vezes não falta sentimento, falta capacidade de sentir, então não exija existências do que nunca existiu. Que seja tudo mais claro, tudo mais óbvio, tudo mais limpo e leve. Que levantemos da cadeira, pintemos a grama do vizinho de preto e branco e nos ocupemos em colorir a nossa. Que sejam naturais as desistências de quem não é capaz de nos ter, mas sem mágoas, já é triste demais não ser capaz. E que me perdoe, sempre, se meu doce te enjoou ou se meu fel te doeu até não suportar.

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