Hoje eu acordei com vontade de ser ninguém. Com o gosto
amargo de quem deixa a vida passar. Levantei da cama e senti o peso de três
mundos nas costas e voltei a deitar. Ignorei meus compromissos como um
transeunte ignora o canto da rua que contém um mendigo pedindo dinheiro.
Ignorei meus impulsos de tentar e os de desistir – fui nada por um dia. A vida
que me chuta o estômago me convida pra viver, cê acredita? Sei que sim, e que é
assim com você também.
Por um dia eu quis ser arrastada pelas horas até chegar em
outro mês, outro ano, outra vida. Eu quis voltar pro útero e ficar por lá. A
gente sofre com o sofrimento e se cobra por estar sofrendo. A gente se condena
porque precisa de um dia desses pra ser nada. Todos os dias eu acordo às sete
da manhã pra ser alguém. Uma filha, uma amiga, uma funcionária, uma estudante,
uma namorada. E cada uma delas chega cansada no fim do dia; com o peso de não
ter conseguido o que queria, por ter feito o que não devia, por não ter falado
o que realmente importa, por ter pensado demais ou de menos.
Todos os dias eu volto pra casa sobrecarregada de mim, na
alma e no corpo. Mas pra cada desejo de desistir de ser alguém existe uma
vontade ainda maior de ser o dobro do que já sou. Duas vezes namorada, duas
vezes filha, duas vezes amiga. E voltar pra casa no fim do dia duas vezes mais
cansada, porque vale a pena. Viver não é leve como dizem - ou você vive e
carrega quem você é ou passa a vida sendo ninguém mas querendo ser alguma
coisa.
Eu decidi que apesar do peso de três mundos nas minhas
costas eu não vou desistir de ser quem eu sou. Eu não vou frear meus sonhos nem
ignorar meus medos. Porque se dez vezes eu cheguei no fundo do poço, onze vezes
eu descobri como é bom alcançar a superfície novamente. E mesmo que doa, que
canse e que me deixe sem fôlego a ponto de tirar um dia só pra ser ninguém, eu
vou continuar vivendo. E eu não vou me condenar por querer desistir, porque
mais forte do que aquele que nunca pensou em abandonar o barco é aquele que já
quis se deixar afundar, mas quando percebe já está remando de novo.
Querer viver e não conseguir é igual a viver sem querer. Então eu vou acordar amanhã e, apesar do gosto amargo e do peso das costas, eu vou viver querendo vida.
Querer viver e não conseguir é igual a viver sem querer. Então eu vou acordar amanhã e, apesar do gosto amargo e do peso das costas, eu vou viver querendo vida.
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