Eu e você em três atos

I.
Você apareceu pra mim naquele bar como qualquer um. Aquela noite de quarta-feira era a minha primeira tentativa de ser feliz depois de anos numa fossa sem fim. Minha primeira tentativa de jogar sinuca, num bar caindo aos pedaços, cheio de gente hardcore fumando e assoprando fumaça na minha cara. E lá estava você, não tão alto nem tão magro como eu gostava, não tão simpático, não tão galinha. Enfim, você apareceu pra mim como alguém que eu dispensaria em cinco segundos. Se tivesse olhado pra mim. Sim, além de mediano, corpo escultural e cara amarrada, você me ignorou por completo. E eu te achei um babaca.

II.
Até hoje não sei o que fez a gente conversar. Eu descobri que você não era babaca e, depois de vários dias conversando, eu te chamei de anjo. Porque era o que você parecia naquele momento. Alguém que veio me mostrar que o amor é lindo e por aí vai. Fizemos tudo como manda o figurino. Conhecemos família, saímos em casal, dormimos muito, paramos de sair em casal, ficamos em casa olhando um pra cara do outro e pronto. Eu não só não era mais a mais bonita, como não era a mais magra. E não só gastava demais, como fazia tudo errado. E você preferia brigar e ter razão a ficar em paz e assistir a um filme comigo.

III.
Você apareceu pra mim como qualquer um, virou tudo que eu queria e, depois, tudo que eu não conseguia mais suportar. Num primeiro momento, você era tão carinhoso que eu não percebi que era orgulhoso demais pra lutar por mim, e que eu lutei sozinha por todos esses anos. E eu era tão apaixonada que não percebia que não tínhamos nada a ver. O que você não esperava é que, se eu não era a mais bonita, a mais magra e a mais bem sucedida, eu não ia tentar ser só pra te agradar. Eu finalmente entendi que eu não precisava de um anjo. Porque eu não precisava ser salva. E você, que queria tudo, ficou sem nada. E resumiu nós dois em três atos.

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